Descrito até agora como um porto seguro para o governo Lula (PT), o Senado tem levado ao Palácio do Planalto queixas que incluem o descumprimento de acordos e a falta de comunicação de decisões.
 

Embora os articuladores do governo ofereçam justificativas para diferentes casos de descontentamento, as reclamações são suprapartidárias e ameaçam minar a relação com o governo.
 

O senador Chico Rodrigues (PSB), por exemplo, não só teve sua indicação frustrada para um cargo do Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) como soube pelo Diário Oficial que a vaga tinha sido ocupada por um afilhado político do ex-senador Romero Jucá, seu rival em Roraima.
 

Assessores palacianos afirmam que, em caso de disputa por um cargo, a preferência na indicação é para os correligionários dos ministros, como um critério de desempate. O Dnit é subordinado ao Ministério dos Transportes, cujo titular é Renan Filho (AL), do MDB de Jucá.
 

Chico Rodrigues se queixou a senadores de ter sido surpreendido sobre a deliberação. Ex-vice-líder do governo Jair Bolsonaro (PL) no Senado, Rodrigues se filiou ao PSB de Geraldo Alckmin para reforçar a base de Lula.
 

Já a senadora Eliziane Gama (PSD-MA) reclamou a seus pares de não ter sido atendida pelo ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), após amargar mais de uma hora de espera em sua antesala do Palácio do Planalto.
 

Era o dia da votação do Marco do Saneamento, da qual o governo Lula saiu derrotado. Eliziane estava acompanhada do líder do PSD no Senado, Otto Alencar (BA), e buscava solução para um impasse com a bancada do partido na Câmara, que tinha apresentado outro nome para a mesma vaga pleiteada pela senadora no Ministério da Pesca.
 

A Secretaria de Relações Institucionais tinha encaminhado a indicação de Eliziane para o ministério, que é chefiado por André de Paula, do PSD. Para dirimir a disputa, Padilha se reuniria com os líderes do PSD na Câmara e no Senado.
 

Mas o líder do PSD na Câmara, Antonio Brito, não compareceu. Sem sua presença, a reunião não aconteceu. A senadora não foi recebida e deixou o Palácio reclamando de descortesia.
 

Também no PSD, uma fonte de insatisfação se refere ao destino da ex-senadora Kátia Abreu (TO) no governo. Depois de ter o nome boicotado pela CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) para o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), ela tinha sido indicada para a vice-presidência de Agronegócios do Banco do Brasil.
 

Mas, por ser mãe do senador Irajá Abreu (PSD-TO), sua nomeação afrontaria a lei das estatais. Essa explicação não satisfez o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que lembrou outras nomeações do governo que esbarrariam na lei —entre elas, a do atual presidente do BNDES, Aloizio Mercadante (PT). Mas, no caso da ex-senadora, a coordenação política do governo ressaltou que a regra é clara quanto à vedação a parentes, em primeiro grau, de parlamentares.
 

Pacheco ainda cobra uma saída satisfatória para Kátia. Ele além reclamou de ter sido surpreendido pela notícia de que Gabriel Galípolo, secretário-executivo da Fazenda, seria o escolhido para a diretoria do Banco Central.
 

No dia em que o nome foi anunciado, Pacheco estava em evento em São Paulo e soube da decisão pela imprensa.
 

As queixas partem até mesmo da oposição. Ministra do governo Bolsonaro, Tereza Cristina (PP-MS) manifestou sua contrariedade durante reunião de líderes do Senado, após ter sido “desconvidada” para a relatoria da MP da regularização ambiental.
 

Convidada pelo líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (AP), Tereza se debruçou sobre o texto durante um fim de semana. Mas Pacheco indicou Efraim Filho (União Brasil-PB) para a relatoria.
 

Assessores palacianos afirmam que a opção de Pacheco por Efraim se deveu ao fato de a União Brasil ter modificado o texto na Câmara, incluindo um jabuti que afrouxava a proteção à mata atlântica durante votação em plenário.
 

Com a mudança, os governistas optaram por um senador da União Brasil para excluir a emenda apresentada pelo próprio partido. Mesmo assim, a senadora registrou seu protesto na reunião.
 

Na semana passada, Padilha se reuniu com Pacheco com o objetivo de azeitar a relação na Casa. Para Randolfe, esses são problemas resolvíveis.
 

O líder do governo do Congresso admitiu que existe, no Senado, um estresse decorrente da falta de prazos para a votação. Mas, nesses casos específicos, é possível encontrar soluções negociadas com seus pares, segundo Randolfe.
 

Sobre Tereza Cristina, ele diz que o convite foi um gesto à oposição. Mas a palavra final coube a Pacheco.
 

Reservadamente, um dos líderes da base brinca que não conseguiria trabalhar se decidisse montar um balcão de reclamações no Senado.
 

Apesar disso, ele afirma que a Casa também reconhece os esforços de Padilha e do ministro Fernando Haddad, da Fazenda, que tem procurado o Parlamento para tratar do arcabouço fiscal.
 

Outro ponto que pesa a favor de Lula é o líder do governo, senador Jaques Wagner (PT-BA), conhecido como cumpridor de acordos.
 

Segundo aliados, o presidente da República mantém uma boa relação com Pacheco, com quem conversa frequentemente.
 

O governo aposta no Senado para reverter derrotas sofridas na Câmara, a exemplo do que aconteceu com a MP da regularização ambiental.
 

O Palácio do Planalto também conta com os senadores para manter de pé os decretos editados pelo presidente sobre o Marco do Saneamento, já derrubados pelos deputados federais na primeira grande derrota do governo no Congresso.