O procurador Deltan Dallagnol teria usado dois grupos políticos surgidos após a Operação Lava Jato, o Vem pra Rua e o Instituto Mude, como porta-vozes de causas políticas pessoais dele e da operação.

É o que apontam mensagens trocadas por meio do aplicativo Telegram e que fazem parte do arquivo da “Vaza Jato”, que teve a 15ª parte divulgada hoje (12) pelo portal The Intercept Brasil (veja aqui na íntegra).

Nos diálogos, Dallagnol pauta atos públicos, publicações em redes sociais e até manifestações dos movimentos de forma oculta. Ele ainda teria tomado cuidados para não ser vinculado publicamente a eles.

Os chats mostram que Dallagnol começou a se movimentar a fim de influenciar a escolha do novo relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF) um dia após a morte do ministro Teori Zavascki, antigo responsável pelos processos da operação na Corte.

Próxima ao coordenador da força-tarefa, a procuradora Thaméa Danelon, ex-integrante do braço paulista da Lava Jato – que chegou a coordenar por menos de dois meses no fim de 2018–, em várias ocasiões funcionou como uma espécie de ponte com o Vem pra Rua.

O Instituto Mude — Chega de Corrupção foi criado inicialmente para coletar assinaturas a favor das dez medidas contra a corrupção. O pacote de mudanças legislativas veio a se tornar uma obsessão pessoal de Dallagnol. O coordenador da Lava Jato no Paraná teria atuado como um diretor informal do movimento, que chegou a organizar encontros em uma igreja frequentada pelo procurador – e em que ele é pregador eventual.

A reportagem mostra que, com a derrota na votação das dez medidas na Câmara Federal, Dallagnol passou a usar o Mude e ainda o Vem Pra Rua para outras tarefas, como influenciar a escolha do relator da Lava Jato no STF após a morte de Zavascki.

Dallagnol agiu nos bastidores dos grupos e impulsionou a pressão ao STF, para rejeição dos nomes de Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e do atual presidente da Corte, Dias Toffoli, para a relatoria das ações da operação.

Os diálogos mostram também que o procurador articulou ações para constranger ou pressionar ministros nos julgamentos que discutiram a prisão em segunda instância.

No ano de 2017, Dallagnol teria ainda encomendado aos movimentos uma campanha para forçar Michel Temer a indicar o primeiro nome da lista tríplice encaminhada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), ao cargo de procurador-geral da República. O escolhido substituiria Rodrigo Janot, que esteve à frente do órgão durante o surgimento e a ascensão da Lava Jato.

Outro lado

Em resposta à reportagem, a assessoria de imprensa do Ministério Público Federal (MPF) do Paraná sustentou que “é lícito aos procuradores da República interagir com entidades e movimentos da sociedade civil e estimular a causa de combate à corrupção”.

No entanto, o Código de Ética e de Conduta do Ministério Público da União diz que é compromisso de conduta ética dos procuradores “atuar com imparcialidade no desempenho das atribuições funcionais, não permitindo que convicções de ordem político-partidária, religiosa ou ideológica afetem sua isenção”.

“O procurador Deltan Dallagnol não lidera nem integra o Mude, mas apoia o instituto que é apartidário; conhece seus integrantes e seu compromisso com a causa pública e fez doações, que permitiram o desenvolvimento de um curso online de cidadania”, diz o comunicado do MPF.

Já o Instituto Mude informou que “o contato com o coordenador da maior operação de combate à corrupção já realizada no Brasil é natural” e que ele “iniciou-se a partir do conhecimento da proposta das dez medidas contra a corrupção”.

Ainda alegou que as ações do movimento “não são ou foram definidas por sugestões de indivíduos ou entidades” e que “Dallagnol nunca foi integrante ou associado do Instituto Mude, muito menos fez parte da liderança do movimento”.

Em sua defesa, o Vem Pra Rua informou que “na campanha a favor das 10 Medidas Contra a Corrupção buscou parcerias de outros movimentos, entidades e pessoas alinhadas com seus ideais, mantendo sempre sua autonomia”.

A procuradora Thaméa Danelon preferiu não fazer comentários sobre a reportagem.

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