A Cactvs está proibida de operar com o BNB até março de 2025 por problemas em uma concorrência em que o banco buscava um parceiro para seu programa de microcrédito rural, o maior do país e que serviu de modelo para a Caixa. O veto à contratação da empresa é fruto de decisão do próprio BNB após os problemas.
 

O contrato analisado pela Caixa prevê o pagamento em 60 meses. Mas o valor pode ir além dos R$ 411 milhões, a depender do desempenho da operação. A estimativa é de operar 40 mil contratos anuais de microcrédito, sendo que 66% da remuneração fica com a Cactvs e o restante com a Caixa.
 

Os fundos para os empréstimos virão do FCO (Fundo Constitucional do Centro-Oeste) e do FNO (Fundo Constitucional de Financiamento do Norte), que ficarão com o risco de inadimplência. Já o risco operacional ou de fraude é da Cactvs.
 

As condições do microcrédito preveem contratos de até R$ 10 mil com carência de até 36 meses e prazo de pagamento semelhante.
 

Além das acusações de fraude que recaem sobre a empresa, outro fato que se tornou um problema no processo de contratação é uma investigação que o responsável pela área jurídica da Cactvs enfrenta na SEC (sigla em inglês para o órgão responsável pelo mercado de ações dos Estados Unidos).
 

Fernando Passos é ex-diretor da resseguradora IRB e deixou o posto em 2020 após a abertura de processo pela divulgação de um boato falso de que a Berkshire Hathaway, do megainvestidor Warren Buffett, estava interessada em ações da empresa. O movimento levou a uma alta no preço dos ações do IRB e foi desmentido pela companhia norte-americana.
 

O caso está no Judiciário americano e ainda não teve um desfecho. O IRB entrou em um acordo com o Departamento de Justiça dos EUA pelo mesmo caso e pagou US$ 5 milhões.
 

A Cactvs foi criada após a saída de Passos do IRB. A atual presidente da empresa é sua mulher, Kelvia Passos.
 

Outro funcionário da companhia é o ex-presidente da Caixa Gilberto Occhi, ligado ao PP. O atual presidente da Caixa, Carlos Antônio Vieira Fernandes, foi secretário-executivo de Occhi no Ministério da Integração Nacional em 2015 e 2016.
 

Vieira foi indicado para a presidência da Caixa pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), no fim de 2023. O presidente Lula (PT) fez a nomeação em um esforço para se aproximar do centrão e conseguir aprovar projetos prioritários no Congresso Nacional.
 

A contratação da Cactvs pela Caixa está sendo tocada pelo sobrinho do presidente do banco público, Marcos Antonio Vieira Fernandes, superintendente na subsidiária de cartões do banco.
 

Procurada, a Caixa informou que o modelo de contratação foi desenvolvido a partir de um grupo de trabalho na presidência da instituição financeira “formado por técnicos, funcionários concursados da empresa, com experiência no assunto”.
 

Em seguida, afirma a Caixa, uma consulta pública foi aberta, na qual só a Cactvs foi habilitada para operar o microcrédito.
 

“A Caixa esclarece que esse tipo de decisão segue a governança da empresa, composta de colegiados com pareceristas e conselheiros autônomos que recebem subsídios técnicos e análises de diversas unidades”, disse, em nota, a instituição.
 

O banco disse ainda que a contratação da Cactvs está em análise pela equipe técnica da instituição e ainda não foi deliberada pela governança do banco.
 

À reportagem, a Cactvs informou que o Ministério Público Federal entendeu não ter havido crime da empresa na licitação do Banco do Nordeste. A suspensão aplicada pelo BNB à Cactvs possui abrangência apenas no âmbito próprio BNB, sendo ilegal sua expansão para outros órgãos da administração pública”, acrescentou.
 

Sobre Fernando Passos, a empresa disse que ele não participa do quadro de acionistas ou administradores estatutários da companhia, “atuando como o advogado responsável pelo setor jurídico da companhia”. Já Occhi “atua como assessor da Cactvs em diversos projetos voltados para nossas operações de varejo”.
 

Passos, Occhi e Marcos Antonio Vieira Fernandes não quiseram se manifestar quando procurados pela Folha. A Caixa busca um novo modelo para o microcrédito após o ex-presidente Jair Bolsonaro usar a modalidade no banco para fins eleitorais, o que levou a um calote bilionário. A inadimplência na modalidade foi de cerca de 80%.
 

O resultado foi um rombo de mais de R$ 2 bilhões para o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), por ter fornecido os recursos para o programa. O prejuízo da Caixa foi de cerca de R$ 500 milhões.
 

A instituição oferecia, por meio do aplicativo Caixa Tem, empréstimos de até R$ 1.000 para pessoas físicas, inclusive a quem estava com o nome sujo, e até R$ 3.000 para microempreendedores individuais.