São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Goiás, Pará e Santa Catarina receberam, neste sábado (25), a mobilização de uma parceria inédita do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) com o Instituto Data Favela e a Cufa (Central Única das Favelas) para facilitar as entrevistas finais feitas pelos recenseadores do Censo Demográfico 2022 nas comunidades. É a ação Favela no Mapa.
 

A reportagem acompanhou o início do trabalho na favela de Heliópolis (zona sul da capital paulista). A meta é que os 150 recenseadores que atuarão no complexo finalizem as entrevistas em 2.700 domicílios até o domingo (26), de acordo com Thiago Teles Brandão Ferreira, coordenador técnico do Censo Demográfico 2022.
 

O lançamento da parceria teve a presença da ministra do Planejamento e Orçamento da gestão Lula, Simone Tebet. Ela chegou em Heliópolis por volta das 10h, visitou a sede da Cufa e tentou conscientizar a população sobre a importância de atender o recenseador.
 

“Aqui precisa de escola ou creche? De saneamento básico ou água encanada. Esse recurso a ser utilizado só pode ser feito quando o IBGE consegue entrar em cada casa para perguntar às famílias como elas vivem. A partir daí, nós entrarmos com políticas públicas baseadas em evidências num país que se desacreditou por quatro anos nessa questão”, disse a ministra.
 

Tebet circulou por algumas ruas na entrada da favela de Heliópolis até um local com esgoto a céu aberto que isola uma parcela de Heliópolis do restante da favela. Moradores disseram que muitas vezes, o local inunda. Colocar a favela no orçamento foi uma promessa da ministra às entidades locais.
 

“Ela prometeu que não faltará verba no IBGE e que vai negociar junto com o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) o financiamento para a cidade de São Paulo resolver o problema do saneamento básico”, conta Meirelles.
 

Durante discurso, o presidente interino do IBGE, Cimar Azeredo, minimizou o atraso para o término do censo 2022. Ele disse que a cobertura do Censo foi finalizada, mas “sentiu necessidade de aumentar o aproveitamento das entrevistas nas favelas no Brasil inteiro”.
 

De acordo com Renato Meirelles, presidente dos institutos Data Favela e Locomotiva, a parceria é importante para quebrar os estigmas relacionados à resposta do censo.
 

“A meta é que a favela não fique atrás do restante do Brasil. Historicamente, são recenseadas cerca de 96% das famílias brasileiras. O objetivo é alcançar o mesmo nível ou mais.”
 

Segundo Meirelles, 17,9 milhões de brasileiros vivem em favelas. O levantamento é resultado da pesquisa Data Favela 2023, que mapeou 13.151 comunidades no Brasil.
 

“Se as favelas brasileiras formassem um estado da federação, seria o terceiro mais populoso do país”, ressalta Meirelles. “A favela é a concentração geográfica da desigualdade”, afirma o presidente do Data Favela.
 

Ao longo dos próximos dias, os recenseadores do IBGE percorrerão as comunidades acompanhados pelos integrantes da Cufa, quando necessário.
 

“As lideranças da Cufa que já conhecem o território servirão de guias para os recenseadores. A partir do momento em que o IBGE indicar que há dificuldade de acesso em algum território, elas serão acionadas e farão a mediação”, afirma Kalyne Lima, presidente da Cufa.
 

“Temos uma realidade no Brasil muito adversa. As políticas públicas, muitas vezes, não atingem a totalidade da população porque as pesquisas não alcançam. Nosso objetivo é ampliar ao máximo possível o alcance dessas políticas nas favelas, diz Lima.
 

A recenseadora Luscélia da Silva Gonçalves Lopes disse que uma das dificuldades do trabalho é encontrar as casas pela numeração. Há vielas com números iguais, o que dificulta a ação.
 

Outro obstáculo é o horário. As pessoas saem cedo de casa e voltam tarde. Entrar nas vielas à noite é perigoso, segundo Lopes. Além disso, há o problema das recusas. “Eles são firmes na recusa. Não é não. Às vezes, trocamos o recenseador, mas não adianta”, conta.
 

Dados do IBGE mostram que, no país, o índice de recusa e ausência em domicílio nos aglomerados —favelas, comunidades e grotas— é de 8,1%; no estado de São Paulo, o percentual é de 16,3%.
 

A reportagem acompanhou a visita do recenseador Werner Engbruch, 30, à casa da arrematadeira de costura, Lenilda Oliveira França, 54. Ela disse que viu os recenseadores algumas vezes, mas não fez a entrevista. Não soube explicar o porquê.
 

Engbruch contou que a população tem medo de fraudes e de perder benefícios do governo. “As pessoas podem ficar tranquilas, porque os dados são sigilosos e não são repassados a outras instituições individualmente. A Receita Federal não vai aumentar seu imposto por causa do censo”, afirma.
 

De acordo com o MPO (Ministério do Planejamento e Orçamento), o IBGE já coletou dados de mais de 91% da população brasileira.
 

Desde 1º de março, o instituto entrou na etapa de apuração dos dados, que corre em paralelo a ações finais de coleta e está prevista para terminar no final de abril.
 

Além da ação nas favelas, o MPO lidera uma cooperação com outros cinco ministérios do governo Lula para concluir, até o final deste mês, o censo na Terra Indígena Yanomami, em Roraima e no Amazonas.
 

A previsão é que os dados preliminares do censo serão anunciados pelo IBGE no dia 2 de maio.