Uma conversa tensa sobre a proposta de taxar empresas ou fundos offshore (fora do país) precedeu a declaração do ministro Fernando Haddad (Fazenda) de que a Casa comandada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), tem um “poder muito grande”.
 

Segundo interlocutores dos dois lados ouvidos pela Folha de S.Paulo, Haddad e Lira conversaram por telefone na sexta-feira (11) para tratar da votação da medida, considerada crucial pela Fazenda para dar maior isonomia tributária e reforçar as receitas do Tesouro no ano que vem, quando o governo tem a meta de zerar o déficit fiscal.

No diálogo, Lira deixou claro, em tom incisivo, que resiste ao avanço da medida.
 

As resistências na Câmara à proposta geraram incômodo e irritação na equipe econômica, segundo os relatos. A entrevista ao programa Reconversa, gravada na noite de sexta e na qual Haddad faz críticas à Câmara, foi concedida após esse ruído.
 

A tributação das offshores, medida para taxar recursos mantidos em paraísos fiscais, tramita no Congresso em uma MP (medida provisória) que tem validade até 27 de agosto, como compensação à renúncia fiscal gerada pela correção da tabela do IRPF (Imposto de Renda da Pessoa Física). Se não for votado até lá, o texto expira, e o governo precisará enviar um projeto de lei.
 

Para tentar evitar esse desfecho, o relator da MP do salário mínimo, deputado Merlong Solano (PT-PI), incluiu o texto da MP das offshores em seu parecer, que já foi aprovado pela comissão mista. Agora, o texto precisa passar pelos plenários da Câmara e do Senado.

Segundo relatos, a saída desagradou Lira, que exerce menos influência sobre as comissões mistas e inclusive tem tentado mudar o rito de tramitação das MPs.
 

A avaliação é que a MP do salário mínimo, um tema tido como de maior consenso no Congresso, foi usada para embutir uma pauta de tributação ainda não totalmente acordada entre os líderes.
 

Relator da MP, Solano contou à Folha de S.Paulo que Lira ainda não sinalizou quando a MP será incluída na pauta da Câmara. “Ele disse: ‘Há problemas que não estão resolvidos'”, afirmou o deputado sobre seu diálogo com o presidente da Câmara.

A equipe econômica teme que haja grande pressão para excluir a tributação das offshores do texto da MP. Parlamentares e o próprio Lira, segundo relatos, têm trabalhado por isso.
 

Mesmo que o governo envie um projeto de lei para investir novamente na medida, sua aprovação demandaria elevada habilidade política do governo, pois mudanças no IR precisam ser aprovadas no ano anterior para ter validade. Se o Congresso votar só em 2024, a iniciativa surte efeito só em 2025.
 

Os ruídos entre a Fazenda e líderes da Câmara também ocorrem em um momento em que membros do centrão estão irritados com a demora do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em concretizar as mudanças na Esplanada dos Ministérios, garantindo a entrada de PP e Republicanos no Executivo.

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