O presidente eleito Donald Trump pode fazer do perdão a acusados envolvidos na invasão do Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, uma das suas primeiras ações à frente do governo dos Estados Unidos. Essa expectativa é compartilhada por algumas das aproximadamente 1.500 pessoas que enfrentam acusações de crimes relacionados à tentativa de impedir a confirmação de Joe Biden como presidente.

Ao contrário do Brasil, onde a anistia requer autorização do Legislativo, a Constituição americana confere ao presidente o poder de perdoar qualquer pessoa acusada de crimes federais. Durante sua campanha, Trump afirmou várias vezes que pretendia perdoar aqueles que considerasse “inocentes”, embora não tenha explicado como planeja proceder. Especialistas citados pela Folha indicam que um simples ato de Trump pode livrar seus apoiadores das penas impostas.

Trump tomará posse em 20 de janeiro e, até o momento, cerca de 1.500 pessoas foram acusadas de crimes que vão desde invasão de propriedade até agressão a policiais e conspiração sediciosa; pelo menos 600 já foram condenadas. Esta é a maior investigação da história do FBI sobre crimes federais, desencadeada após Trump se recusar a aceitar sua derrota nas eleições de 2020 e incitar seus apoiadores com alegações infundadas de fraude eleitoral.

Desde o anúncio da vitória de Trump em 6 de novembro, advogados que representam os acusados têm utilizado essa nova realidade política para solicitar adiamentos ou anulações das condenações. Alguns já escreveram diretamente ao presidente eleito pedindo clemência.

O jornal The New York Times reportou que a defesa de Joseph Biggs, um dos líderes do grupo extremista Proud Boys, enviou uma carta a Trump logo após as eleições solicitando perdão. Biggs cumpre uma pena de 17 anos por conspiração sediciosa, e outros membros do grupo também estão buscando o mesmo.

A maior pena imposta até agora foi de 22 anos para Enrique Tarrio, outro líder dos Proud Boys e considerado um dos mentores da insurreição. Em um caso distinto, a defesa de Christopher Carnell, um réu da Carolina do Norte, pediu à Justiça o adiamento de uma audiência marcada para a semana passada, argumentando que Carnell espera ser aliviado das acusações com a nova administração. A juíza Beryl Howell negou o pedido.

Trump já havia declarado em março deste ano sua intenção de perdoar os invasores, referindo-se a eles como patriotas e prisioneiros políticos. “Estou disposto a perdoar muitos deles”, postou Trump na plataforma Truth Social. Ele reiterou sua intenção em várias ocasiões e afirmou que realizaria esses perdões nos primeiros dias de seu governo.

Essa possibilidade gera preocupação entre advogados e cientistas políticos, que veem no eventual perdão uma maneira de Trump contornar decisões judiciais e legitimar comportamentos violentos. “Se isso ocorrer, representa uma violação aos princípios da democracia”, avalia Vincent Hutchings, professor de ciência política da Universidade de Michigan. Ele acredita que Trump cumprirá sua promessa: “Não vejo razão para ele não cumpri-la”.

A invasão ao Capitólio ocorreu no dia da diplomação de Biden e foi precedida por meses em que Trump insistiu na suposta fraude eleitoral nas eleições de 2020. O ataque resultou em mais de 140 policiais agredidos e pelo menos cinco mortes relacionadas ao evento. Os danos materiais causados pelos revoltosos são estimados em mais de R$ 13 milhões. A situação forçou a Câmara e o Senado a trancarem suas portas e interromperem as sessões destinadas à confirmação da vitória de Biden, poucos minutos após Trump incitar ativistas durante uma manifestação na capital americana.