Governo Lula acelera concessões sob a nova modelagem de outorga, adotado no ano passado na tentativa de atrair mais concorrentes Redação 26 de agosto de 2024 Destaque, Notícias, Política, ultimas notícias, ÚLTIMAS NOTÍCIAS Com oito leilões de rodovias federais marcados ou previstos para este segundo semestre, o governo vai acelerar as concessões sob a nova modelagem de outorga, adotada no ano passado na tentativa de atrair mais concorrentes. As estradas a serem desestatizadas estão localizadas em estados como Goiás, Minas Gerais e Paraná e terão prazo de concessão de 30 anos. No próximo dia 29 de agosto, o Ministério dos Transportes e a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) realizarão o leilão de um trecho de 303,4 km da BR-381 que se estende de Belo Horizonte a Governador Valadares (MG). A estrada é conhecida como “rodovia da morte” por apresentar um alto índice de acidentes. Em 2023, o governo Lula (PT) já havia tentado leiloar o trecho, que não recebeu propostas e, por isso, teve o certame adiado. No ano passado, uma série de leilões de estradas, portos e aeroportos registrou pouca concorrência, com apenas dois candidatos na maioria dos casos. No modelo de leilões de rodovias adotado pela gestão Lula, os interessados dão lances de desconto em relação à tarifa básica de pedágio, e o pagamento de aporte (caução) é necessário, somente, quando o corte na tarifa prometido é de 18% ou mais. A partir desse patamar há a incidência de aporte de recursos para cada 1% de deságio apresentado, de forma cumulativa. Os recursos do aporte irão inteiramente para a conta da concessão e serão utilizados, por exemplo, na execução de obras não previstas. Procurado pela reportagem, o Ministério dos Transportes disse que os dois leilões realizados em 2023, de rodovias paranaenses, foram “muito exitosos, com a participação de dois novos entrantes, os grupos Pátria e EPR, que ainda não tinham concessões federais”. De acordo com a pasta, o primeiro leilão deste ano, o da BR-040, teve o maior número de participantes desde 2018, com quatro proponentes. “É preciso lembrar que durante quatro anos a gestão passada realizou apenas seis leilões rodoviários”, afirmou em nota a pasta, que projeta R$ 73 bilhões em investimentos com leilões e relicitações deste ano. Especialistas ouvidos pela Folha apontam que, apesar de a nova modelagem ser benéfica, outras medidas poderiam tornar os leilões de rodovias mais atrativos para a iniciativa privada. Na visão de Claudio Frischtak, sócio da consultoria internacional de negócios Inter.B, uma alternativa seria aumentar o prazo do contrato, para que as concessionárias tenham mais tempo de perceber retorno dos investimentos. Ele diz que, além de estarem sujeitas a uma grande pressão do poder público, o setor rodoviário também sofre com o vandalismo nas estradas, o que eleva os gastos das concessionárias. “A complexidade de operar uma rodovia no país é muito grande. Mesmo sistemas de mobilidade urbana de média e alta densidade têm menos interferência. Operar um metrô é relativamente mais fácil [do que uma rodovia]”, afirma Frischtak. Segundo o advogado especialista em infraestrutura Fernando Vernalha, os atuais projetos de concessões de rodovia não têm números tão atraentes para o setor privado e se tornam menos interessantes do que outros investimentos. “Tem que dar retornos interessantes para o investidor travar o capital dele num projeto de longo prazo. Tem que ter um prêmio que seja satisfatório.” Ele aponta como uma alternativa a concessão de trechos menores, o que ampliaria a quantidade de empresas com capacidade de concorrer pela licitação, diz. Para Marco Aurélio Barcelos, diretor-presidente da ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias), os novos contratos são mais maduros em relação a projetos de anos atrás. Ele afirma que as novas concessões já discutem riscos que as concessionárias não podem prever, como as enchentes no Rio Grande do Sul e a pandemia de Covid. “Os riscos extraordinários equivalem a incertezas que ninguém consegue identificar ou entender. Se eles vierem [a acontecer], o prejuízo não vai ser suportado pela concessionária. Você tira essa zona cinzenta do contrato e permite que as propostas sejam mais bem elaboradas e que não haja nenhuma surpresa ao longo da vigência do contrato”, diz. O governo federal já realizou três leilões sob as novas regras de modelagem, segundo a ANTT. O primeiro deles, em agosto do ano passado, concedeu 473 km de rodovias no Paraná para o Infraestrutura Brasil Holding XXI por um prazo de 30 anos. O consórcio, controlado pelo Grupo Pátria, ofereceu um desconto de 18,25% na tarifa por quilômetro rodado. No mês seguinte, o governo fez o leilão de mais 605 km de estradas no Paraná. Único interessado, o Consórcio Infraestrutura PR (associação entre as companhias EPR e Perfin Voyager) ofereceu 0,08% de desconto na tarifa. Em abril deste ano, o trecho da BR-040 que liga Belo Horizonte a Juiz de Fora (MG) foi arrematado pelo Consórcio Infraestrutura MG, parte do grupo EPR. O ganhador propôs desconto de 11,21% na tarifa de pedágio. A CCR e a Vetor Norte, outras concorrentes, ofereceram deságios de 1% e 0%, respectivamente. Como o lance da EPR foi significativamente maior, o leilão não chegou à etapa viva-voz, quando os proponentes vão aumentando suas propostas. O consórcio Azevedo & Travassos chegou a apresentar proposta pela rodovia, mas foi inabilitado. O governo marcou para setembro o leilão de outra parte da BR-040, chamado de Rota dos Cristais, que vai de Belo Horizonte (MG) a Cristalina (GO). Com 594 km de extensão, o trecho registra 70 mil veículos por dia, dos quais 68% são caminhões, segundo a ANTT. Em outra frente, o Ministério dos Transportes tenta fazer a repactuação de contratos de rodovias considerados “estressados”, jargão usado para quando a remuneração do pedágio não é suficiente para a concessionária tocar os investimentos necessários. “Essas concessões, que acabaram entrando em crise e agora estão numa agenda de repactuação, foram prejudicadas em função disso [modelo insustentável financeiramente]. Muitos investimentos em benefício dos usuários não foram feitos pela incapacidade econômica, por vários motivos, mas também por causa de lances que foram muito agressivos e em função da modelagem da licitação que foi adotada”, diz o advogado Fernando Vernalha.