Deputados de esquerda conseguiram adiar a votação de um projeto antiaborto que seria apreciado nos próximos dias na comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família da Câmara.
 

Desde que o projeto começou a ser discutido no âmbito do colegiado, parlamentares do PT e do PSOL tentam adiar sua votação. Em sessão no último dia 21, os deputados Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ), Erika Hilton (PSOL-SP), Fernanda Melchionna (PSOL-RS) e Erika Kokay (PT-DF) apresentaram um requerimento de retirada de pauta, mas ele foi rejeitado.
 

Com isso, após a leitura do parecer da relatora, parlamentares pediram vistas (mais tempo para analisar o texto). Dessa forma, o PL seria votado no colegiado após duas sessões.
 

No próprio dia 21, no entanto, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), acatou um requerimento de autoria da deputada Erika Kokay que pedia para que o projeto fosse redistribuído à comissão de Defesa dos Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial. O documento foi apresentado pela parlamentar em 24 de outubro.
 

Agora, o texto terá que ser analisado por deputados nessa comissão para depois seguir para análise nos colegiados de Previdência e Família e de Constituição e Justiça e de Cidadania (esse último analisa somente o aspecto constitucional da matéria, não seu mérito).
 

Ele é um projeto terminativo, ou seja, teria sua tramitação finalizada nas comissões, sem passar por plenário –ele só seria apreciado pelos deputados caso fosse apresentado um recurso.
 

Na avaliação de parlamentares governistas, esse movimento de representantes da esquerda significa ganhar mais tempo para adiar a análise do projeto.
 

Isso porque além de incluir uma nova etapa de análise e discussão da matéria, a comissão de Direitos Humanos é comandada pela deputada Luizianne Lins (PT-CE) e tem maioria de parlamentares da base do governo Lula (PT), enquanto a de Previdência e Família tem o deputado Fernando Rodolfo (PL-PE) na presidência e maioria de deputados da oposição.
 

De autoria da deputada Chris Tonietto (PL-RJ), o projeto propõe uma alteração no Código Civil definindo que a vida começa desde a sua concepção, e não no nascimento. Caso avance no Congresso Nacional, o projeto pode levar a restrições aos direitos da mulher em relação ao aborto.
 

Atualmente, as únicas três situações em que o aborto não é criminalizado no Brasil são em caso de estupro, quando a gestação gera risco de vida para a gestante e, por decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), quando é constatada anencefalia fetal.
 

No requerimento, Kokay justifica o pedido de redistribuição da matéria dizendo que o tema da personalidade civil, em qualquer dimensão e aspecto, independentemente do mérito, é matéria que diz respeito ao conjunto de direitos humanos no ordenamento jurídico brasileiro.
 

“A matéria ainda guarda conexão com inúmeras outras questões relativas aos direitos humanos e minorias, como as possibilidades e limites legais da interrupção da gravidez, das terapias gênicas e dos processos reprodutivos artificiais. Assim, afeta outros direitos fundamentais como a saúde sexual e reprodutiva, a dignidade humana, a autodeterminação e a não discriminação”, diz a deputada no requerimento.
 

À Folha, Kokay diz que conversou com Lira informando que havia um parecer técnico da Secretaria-Geral da Mesa pela redistribuição e pediu que ele desse prosseguimento ao processo.
 

A ideia, segundo ela, é que o projeto possa ter o mérito analisado em mais de uma comissão, uma vez que é uma matéria “que tem esse nível de gravidade e que busca rever o que já é lei no Brasil”.
 

“A intenção do projeto é buscar retroceder na interrupção legal da gravidez. Essa é uma discussão de direitos das mulheres, não de governo. E os direitos das mulheres são direitos humanos, tem muita pertinência ser redistribuído. A nosso ver, o projeto, com o que ele representa, não pode ter seu mérito analisado em só uma comissão”, diz Kokay.
 

“É uma vitória da mobilização. Esse projeto é um ataque à ciência, um ataque aos direitos das mulheres”, diz Fernanda Melchionna.
 

Foi na comissão de Previdência, Assistência Social, Infância, Adolescência e Família que, em outubro, foi aprovado projeto de lei que busca proibir casamento homoafetivo, após uma série de adiamentos e tentativas de obstrução de parlamentares de esquerda.
 

Naquele momento, no entanto, parlamentares da base afirmavam nos bastidores que o texto não deveria avançar na Câmara. Isso porque há uma sinalização por parte de líderes partidários e do próprio Lira de que temas que tratam da pauta de costumes não deverão ser tratados no plenário.
 

O projeto aprovado em outubro altera o Código Civil para acrescentar, entre as categorias que “não podem casar”, a de “pessoas do mesmo sexo”. A possibilidade de união legal entre duas pessoas do mesmo sexo foi validada pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em 2011.

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