O calendário marcou nesta sexta-feira (14) seis meses dos assassinatos de Marielle Franco (PSOL), vereadora do Rio, e do seu motorista, Anderson Gomes. Apesar da repercussão internacional, os crimes continuam sem resposta.
Para Jurema Werneck, diretora executiva da Anistia Internacional Brasil, a falta de solução para o caso é inadmissível. “O Estado brasileiro, as autoridades federais e estaduais e as instituições do sistema de justiça criminal têm todos a responsabilidade de garantir que o assassinato de Marielle Franco seja devidamente investigado e que os verdadeiros responsáveis sejam identificados e levados à justiça”, disse.
Até agora, a polícia prendeu cinco suspeitos, mas a participação de cada um dos supostos envolvidos ainda é desconhecida. Para o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, os assassinatos podem ter participação de agentes do estado. No dia em que morreu, Marielle participava de um encontro de mulheres negras na Casa das Pretas, espaço na Lapa, região central do Rio. Imagens de câmeras de segurança mostram que dois carros estacionaram na rua.
Quando Marielle saiu da casa e o carro onde estava deu partida, os dois carros trocaram sinais de alerta e a seguiram. dos criminosos emparelhou com o veículo em que Marielle estava, na rua Joaquim Palhares, próximo à estação Estácio do metrô, atiraram e fugiram em disparada sem roubar nada.
Marielle estava no banco de trás de um Chevrolet Agile branco com sua assessora, que sofreu ferimentos leves. Na frente, estava seu motorista, Anderson Pedro Gomes, que também morreu. Ao todo, foram 13 tiros. O carro foi atingido nove vezes, sendo que todas as balas foram em direção ao banco traseiro, onde ela estava, segundo a Polícia Civil.
Quatro tiros atingiram a cabeça da vereadora. Outros três, a lateral das costas do motorista. Como a maior parte dos disparos atingiram a vereadora, os investigadores da Polícia Civil avaliam que o atirador sabia que Marielle estava sentada naquele lugar. O caso teve repercussão internacional e entrou na pauta da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, órgão da OEA (Organização dos Estados Americanos).
A morte de Marielle ocorreu em meio à intervenção federal na segurança pública do estado. Na prática, com isso, a investigação está sob a responsabilidade do governo Michel Temer (MDB), que decretou em fevereiro a intervenção e escalou um general do Exército para o comando da inédita medida. Polícia Militar e Polícia Civil respondem diretamente aos interventores.
Enquanto isso, o apoio dos moradores da cidade do Rio de Janeiro à presença do Exército vem caindo nos últimos dez meses, mas ainda ser majoritário. O índice dos que são a favor da convocação dos militares diminuiu de 76%, em março, para os atuais 66%, enquanto aqueles que são contrários passaram de 20% para 27%.
Desde outubro, quando o Datafolha fez essa pergunta pela primeira vez, a aprovação às Forças Armadas na capital fluminense já perdeu 17 pontos -naquele mês, eram 83% favoráveis ao emprego de militares para combater a violência no Rio.
Apesar disso, a maioria da população do Rio pede a prorrogação da intervenção federal na segurança pública, prevista para acabar em 31 de dezembro deste ano.
CRIME POLÍTICO
Desde o início, a principal linha de investigação é a de motivação política. Diferentes vereadores prestaram depoimento na condição de testemunha, entre eles, um indiciado na CPI das Milícias, concluída em 2008, na qual Marielle trabalhou.
A assessora de Marielle, que estava no carro no momento do ataque, saiu do país com o marido por medo de represálias. Marielle tinha como causa o avanço dos direitos das mulheres, principalmente as negras. Trabalhou na Comissão de Direitos Humanos da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio), onde atendia vítimas de grupos criminosos e de violência policial. Também ajudava famílias de policiais assassinados.
Com frequência denunciava abusos cometidos por policiais em favelas. Dias antes de morrer, criticou o 41º Batalhão da Polícia Militar, o mais letal do Rio.
Onde Marielle foi morta?
A vereadora foi assassinada dentro do carro, no bairro Estácio (centro do Rio), por volta das 21h30 de quarta-feira (14). Seu veículo foi atacado a tiros, enquanto ela voltava de um encontro com mulheres negras na Lapa, também no centro, a cerca de 4 km dali. Marielle estava no banco de trás de um Chevrolet Agile branco com sua assessora, que sofreu ferimentos leves. Na frente, estava seu motorista, Anderson Pedro Gomes, 39, que também morreu.
Como os criminosos agiram?
O carro dos criminosos emparelhou com o veículo em que Marielle estava, na rua Joaquim Palhares, próximo à estação Estácio do metrô. Após atirarem, eles fugiram em disparada sem roubar nada.
Quantos tiros foram disparados?
Ao todo, foram 13 tiros. O carro foi atingido nove vezes, sendo que todas as balas foram em direção ao banco traseiro, onde ela estava, segundo a Polícia Civil. Quatro tiros atingiram a cabeça da vereadora. Outros três, a lateral das costas do motorista. Como a maior parte dos disparos atingiram a vereadora, os investigadores da Polícia Civil avaliam que o atirador sabia que Marielle estava sentada naquele lugar.
Que arma foi utilizada no crime?
A polícia ainda não sabe que tipo de arma foi usado pelos criminosos. Segundo a perícia, a munição utilizada foi calibre 9 mm, que pode ser disparada por pistolas ou por submetralhadoras. O calibre 9 mm não pode ser vendido à população. Ele pode ser adquirido legalmente por colecionadores, atiradores esportivos e forças de segurança. Porém é comercializado com poucas restrições no Paraguai e entra no Brasil ilegalmente para abastecer o mercado negro.
Qual é a origem da munição usada no ataque?
A munição que matou Marielle foi comprada pela Polícia Federal em dezembro de 2006. Segundo a perícia, é a mesma que foi usada para matar 17 pessoas em agosto de 2015 nas cidades de Osasco e Barueri (Grande SP). À época, a investigação da polícia paulista descobriu que parte das cápsulas encontradas no local do crime pertencia ao lote UZZ-18, comprado pela PF de uma empresa privada. No caso de São Paulo, três policiais militares e um guarda civil foram condenados pela chacina. De acordo com a polícia, não é possível dizer se o grupo da chacina paulista tenha relação com os suspeitos que mataram a vereadora carioca.
É comum desvios de munição comprada por órgãos oficiais no país?
Sim. Segundo a polícia, também é comum que cápsulas de projéteis já disparados sejam reaproveitadas. No caso do assassinato de Marielle e de seu motorista, a munição não tinha sinais de modificações. A vereadora morreu com tiros de pistola calibre 9 milímetros, o mesmo modelo de arma usado por agentes de segurança.
Qual a principal suspeita da polícia?
O chefe da Polícia Civil, Rivaldo Barbosa, admitiu que o crime pode ter sido uma “execução”, mas afirmou que a investigação está sob sigilo. Os indícios são fortes de que tenha ocorrido um crime de encomenda porque nada do carro foi levado, o que enfraquece que a intenção dos criminosos tenha sido um assalto, por exemplo.
Existe algum suspeito preso sob a suspeita de participação nos crimes?
Sim. Cinco suspeitos estão presos, mas cumprem penas por outros crimes. São eles: o ex-PM Orlando Oliveira de Araújo, o Orlando Curicica, apontado como chefe de uma quadrilha de milicianos que atua na zona oeste carioca; o ex-bombeiro Luis Claudio Ferreira Barbosa e outro ex-PM Alan Nogueira -a presença dele no carro que foi usado pelos criminosos para perseguir e matar Marielle ainda é investigada pela polícia. Os três estão detidos por envolvimento em um crime que ocorreu em fevereiro de 2017 na Baixada Fluminense.
As denúncias que levaram os agentes aos nomes dos suspeitos partiram de outro policial, que confessou ter integrado o mesmo grupo paramilitar. Em depoimento prestado em maio, o delator, que teve a identidade preservada, informou ter presenciado conversas entre Curicica (para quem disse ter trabalhado como segurança) e o vereador Marcelo Siciliano (PHS), em junho de 2017. Nesses encontros, o assassinato de Marielle teria sido encomendado pelo vereador e os dois, acertado detalhes do crime.
Com medo de ser morta, a testemunha prestou depoimento em troca de proteção. Siciliano nega qualquer envolvimento com o caso, além de afirmar reiteradas vezes que era amigo pessoal da vereadora, tendo aprovado projetos de lei em parceria com ela.
Em abril, Carlos Alexandre Pereira Maia, assessor de Siciliano, foi assassinado no bairro de Jacarepaguá, na zona oeste carioca. A mesma equipe da Delegacia de Homicídios que investiga o caso de Marielle apura se esta outra morte foi uma espécie de ‘queima de arquivo’.
Dois homens suspeitos pela morte do assessor também foram presos e completam a lista de cinco detidos: Ruy Ribeiro Bastos e Thiago Bruno de Mendonça -sobre este último, pesa a suspeita de ter monitorado os passos de Marielle no dia do assassinato.
Há imagens do crime?
Sim. Os investigadores da Divisão de Homicídios fazem buscas, desde a noite do dia do crime, por imagens de câmeras de segurança entre a Lapa e Estácio. A polícia quer descobrir o trajeto realizado pela vereadora e, assim, descobrir em qual ponto exato o carro começou a ser seguido. A polícia acredita que a placa do carro dos criminosos era fraudada. Segundo o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, todas as câmeras da região foram solicitadas e as imagens já estão sendo analisadas.
Como os criminosos sabiam onde o carro dela ia passar?
A polícia investiga a possibilidade de a vereadora ter sido seguida desde que deixou o evento com mulheres na Lapa até o momento em que foi assassinada. De acordo com os investigadores, imagens de câmeras de segurança da região da Lapa registraram dois homens parados dentro de um veículo por duas horas nas cercanias da Casa das Pretas, na rua dos Inválidos (Lapa), onde Marielle participava de uma roda de conversa. Cerca de quatro quilômetros separam os dois locais. No trajeto, o carro em que Marielle estava circulou por diversas ruas movimentadas, sendo atacado no momento em que passava por um local mais ermo.
Quantas pessoas estavam envolvidas no crime?
A placa do veículo em que estavam os dois homens foi identificada e indica que o carro é de Nova Iguaçu, (Baixada Fluminense). Investigadores tentam rastrear os interlocutores da dupla nas conversas telefônicas, e dados das operadoras estão sendo coletados. A polícia trabalha com a hipótese de que mais de um carro participou da ação. Nas cenas flagradas por câmeras na Lapa, é possível ver dois carros trocando sinais de farol durante a movimentação de saída da vereadora da Casa das Pretas. As investigações apontam que um terceiro veículo pode ter participado do crime -seria aquele que emparelhou com o carro da vereadora no momento do assassinato. A polícia, porém, desconfia que este último pode ser um dos primeiros carros a segui-la. A confirmação depende ainda de novas análises de câmeras de rua.
A vereadora tinha recebido ameaças?
Segundo o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL-RJ), ela não chegou a receber ameaças formalmente, mas sua militância, engajada na proteção de vidas de moradores de comunidades, principalmente contra mortes praticadas por policiais, pode ter sido uma das motivações.
Quais eram suas militâncias?
A vereadora se denominava feminista, negra e criada na comunidade da Maré, na zona norte do Rio. Ela militou por essas três frentes em conjunto. Sua principal militância era pela defesa dos moradores de favelas, principalmente os negros e mulheres. No último sábado (10), denunciou supostos abusos do 41º batalhão, de Acari, o que mais matou pessoas nos últimos cinco anos, segundo o ISP (Instituto de Segurança Pública).
O que a única sobrevivente do ataque contou à polícia sobre o crime?
Ela disse que só conseguiu ouvir um estrondo e não viu nada do que ocorria fora do carro no momento em que os tiros foram disparados. Ela conseguiu apenas retirar a perna de Anderson do acelerador, que naquela altura já estava morto, desligar o carro e se jogar para fora. Agachada, ela se locomoveu até conseguir avisar o marido sobre o ataque, que acionou o socorro mais próximo. Assim que foi encontrada, a assessora, que foi apenas atingida por estilhaços, tremia sem parar. Após ser medicada no hospital, ela prestou depoimento por três horas à polícia.
A Polícia Federal entrou nas investigações?
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, chegou a manifestar que pediria a federalização das investigações sobre o crime. Na prática, a medida significaria a entrada da Polícia Federal no caso. “Certamente, a participação da Polícia Federal é importante nesse episódio, porque o crime no Rio é relativo a todas as áreas”, disse. Nesta sexta (16), ela ensaiou um recuo na proposta. “O pedido de federalização é um passo que vai ser avaliado oportunamente, na medida em que todas essas investigações se desenrolem. A nossa expectativa é de que isso não seja necessário”, disse. O comando das investigações continua com a Polícia Civil do Rio.

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