Aprovada no Senado em 2010, a reforma do Código de Processo Penal voltou à discussão na Câmara dos Deputados e pode ser votada na comissão especial ainda este semestre. Nesta semana, o relator-geral do texto, deputado João Campos (PRB-GO), apresentou o que considera ser a primeira versão do seu relatório para balizar o debate. Pela proposta, o tempo máximo de prisão preventiva passará para três anos e meio, atualmente é indeterminado. Também estabelece prazo para a realização de interceptações telefônicas – de 60 dias prorrogáveis para até 360. Outra mudança estabelece que os embargos de declaração, recurso que pede esclarecimentos sobre uma decisão judicial, poderão ser apresentados apenas uma vez.

João Campos propõe também que a execução da pena só poderá começar após decisões colegiadas de tribunais de Justiça, deixando claro que não seria necessário esperar até o último recurso em tribunais superiores. Este trecho é interpretado, por seus defensores, como um reforço ao entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) para a prisão após condenação em segunda instância.

A próxima reunião da comissão especial está prevista para o dia 24. O relator deve ler o texto definitivo para que o parecer seja divulgado no fim deste mês. Em seguida, será colocado em discussão e votação. No entanto, a votação em plenário só deve ocorrer no segundo semestre.

Investigações
Em meio a polêmicas, na parte sobre as atribuições do processo de investigação criminal, o texto do deputado estabelece que a investigação deve ser conduzida por delegados das polícias Civil ou Federal e que o Ministério Público entraria no processo apenas “subsidiariamente”, nos casos em que a polícia não for eficaz, em razão do abuso de poder econômico ou político.

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), José Robalinho Cavalcanti, criticou os textos preliminares do código. “Existem problemas e avanços no novo código. Nesta parte de investigação criminal, ele piora a situação do que está hoje, pois mantém estrutura atrasada de um inquérito burocrático e lento”, disse.

Para Robalinho, o relator deveria ir por outro caminho. “O relator em vez de tornar o inquérito mais enxuto, menos formalista, ele optou por não só manter, mas centralizar a investigação no delegado. O que isso significa? Um inquérito mais lento e burocrático. Isso não é assim em nenhum lugar do mundo”, analisou o procurador, que pretende encaminhar sugestões.

Diálogo
O relator João Campos disse que está aberto ao diálogo e justifica que o entendimento de seu parecer seguiu o resultado do julgamento realizado pelo Supremo Tribunal Federal, em 2015, quando a Corte tratou dos requisitos para atuação do Ministério Público em investigações penais.

“Procuro fazer em relação a isso é traduzir o voto de sete ministros do Supremo Tribunal Federal. Não estou fazendo nada de iniciativa própria. Sete ministros votaram numa direção em relação a capacidade investigatória criminal do Ministério Público. Se eu não consegui traduzir isso adequadamente, estou pronto para ouvir as sugestões do MP, posso ir lá no Supremo conversar com o relator da matéria, ministro Gilmar Mendes, para que a gente tenha um texto que exprima a vontade ou voto dessa maioria do Supremo Tribunal Federal, não há nenhuma dificuldade em relação a isso”, afirmou o relato.

Segundo Robalinho, a interpretação do deputado sobre o resultado do Supremo está equivocada e pode prejudicar o avanço da Lava Jato, que funciona por meio de uma força-tarefa entre a Polícia Federal, a Receita Federal e o Ministério Público. O procurador lembrou ainda que essa matéria também já foi vencida no plenário da Câmara, na ocasião da apreciação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 37, em 2013. A proposta que garantia às polícias Civil e Federal exclusividade do poder de investigação criminal foi rejeitada por 430 votos a nove, no contexto dos protestos de julho de 2013.

Insistência
Apesar da derrota, os parlamentares insistem em propostas que limitem os poderes do Ministério Público. Atualmente, tramita no Senado a PEC 102/11 que também prevê que só a polícia poderá fazer investigações criminais e o seu controle externo não seria mais exercido pelas promotorias e procuradorias, mas pelo Conselho Nacional de Polícia, ainda a ser criado. A proposta aguarda análise da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) desde setembro do ano passado.

Para a Associação Nacional de Delegados da Polícia Federal, o projeto de reforma do CPP tem avanços e alguns pontos que precisam ser ajustados. Segundo o presidente da entidade, delegado Edvandir Paiva, o novo código deve estabelecer a cooperação na investigação e delimitar as competências de cada órgão para que não haja invasão de atribuições.

“Não é boa essa disputa corporativista para o processo criminal. O novo Código de Processo Penal tem que definir quem faz o que e com que limite”, disse o delegado.

Segundo o policial, a finalidade do inquérito não deve ser somente levantar provas para que o Ministério Público apresente denúncia. “Qual a finalidade da investigação criminal? A busca da verdade. O Ministério Público não pode atravessar a investigação, comandando a investigação”, questionou Paiva.

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