A Justiça da Argentina suspendeu a reforma trabalhista que havia sido incluída pelo governo de Javier Milei no megadecreto com medidas de desregulamentação de vários setores da economia e que foi enviado pelo governo logo após a posse.
 

O texto do DNU (Decreto de Necessidade e Urgência) de Milei conta com um capítulo reservado para questões trabalhistas.
 

A Justiça decidiu conceder uma medida cautelar pedida pela CGT (Confederação Geral do Trabalho), o primeiro “freio” imposto pelos tribunais ao DNU 70/2023, publicado por Milei em 20 de dezembro.
 

A CGT entrou com a liminar em 27 de dezembro, alegando a inconstitucionalidade do trecho do DNU que trata das questões trabalhistas, pedindo uma medida cautelar para evitar que ele entrasse em vigor.
 

O primeiro juiz a receber a denúncia se recusou a emitir a liminar, alegando que o decreto ainda não havia entrado em vigor, mas pediu que o chefe de gabinete de Milei, Nicolás Posse, respondesse à demanda dos sindicalistas. Nesse meio-tempo, a CGT acionou a Câmara Nacional do Trabalho.
 

Por dois votos a um, a câmara não esperou uma justificativa oficial por parte do governo para manter o DNU.
 

A decisão -tomada na terça-feira (2) e publicada nesta quarta (3)- é assinada pelos juízes Andrea García Vior e José Alejandro Sudera. A juíza María Dora González argumentou que o caso deveria ser transferido para o Tribunal Administrativo Federal.
 

“É notório que o segmento dos trabalhadores é socialmente vulnerável e, neste caso, encontram-se em jogo direitos de natureza alimentar. Não há dúvida de que se configuram circunstâncias graves e objetivamente inadiáveis que justificam a expedição da medida cautelar”, diz trecho do acórdão divulgado mais cedo pelo jornal Clarín.
 

Entre os argumentos que apresentados para suspender a aplicação da reforma trabalhista de Milei via DNU um dos magistrados questiona o caráter de urgência das medidas.
 

“Não está claro como as reformas propostas, se aplicadas imediatamente e fora do processo normal de promulgação de leis, poderiam remediar a situação referente à geração de emprego formal, especialmente quando o próprio decreto reconhece que ela está estagnada há 12 anos, o que impede, em princípio, considerar a irrupção de alguma circunstância súbita, imprevisível ou extremamente ‘excepcional’.”
 

A Casa Rosada deve recorrer da decisão, segundo a imprensa argentina.
 

Logo ao assumir, Milei disse que o regime trabalhista precisava de uma modernização para reduzir a burocracia e aumentar o emprego. Na prática, as medidas apresentadas pelo governo facilitam demissões e tornam esse processo menos dispendioso.
 

Um dos aspectos do DNU mais questionados pela central dos trabalhadores trata do aumento do período probatório dos trabalhadores, de três para oito meses, também permite a demissão em caso de bloqueio ou do local de trabalho, algo que os críticos do projeto veem como uma restrição ao direito de greve.
 

O documento também reduz multas e encargos a serem pagos pelas empresas em caso de demissão do empregado.
 

No caso de gravidez, a gestante fica impedida de trabalhar 45 dias antes e depois do parto, mas tem a opção de reduzir em até dez dias o afastamento.
 

O governo também quer modificar a arrecadação sindical, com medidas como a desobrigação das empresas de reter contribuições sindicais dos empregados e exigência de autorização para desconto de contribuições.
 

No último dia 28, a CGT convocou uma greve geral contra o decreto de Milei. Segundo a entidade, que é historicamente ligada ao peronismo, a mobilização vai acontecer no dia 24 de janeiro e tem previsão para durar 12 horas.
 

No próximo dia 10, uma plenária vai decidir os detalhes da manifestação em Buenos Aires, que deve incluir uma marcha em direção ao Congresso, a partir de meio-dia, e deve testar os limites do protocolo antiprotestos da ministra de Segurança Pública de Milei, Patricia Bullrich.
 

O pacote de 366 medidas de Milei tem sido alvo de críticas, por, segundo opositores, dar poderes excessivos ao governo. Além do DNU, o Executivo enviou a chamada “lei ônibus” (por transitar por diversos setores, da economia à política) com um total 664 artigos.
 

Em mensagem de fim de ano aos argentinos no último dia 30, Milei apelou para que a população pressione o Congresso a aprovar suas medidas de emergência, alegando que a não aprovação levaria o país a uma “catástrofe social de proporção bíblica”.
 

Na semana passada, o deputado Pablo Yedlin (do bloco de oposição peronista União pela Pátria) disse esperar que o DNU de Milei será revogado antes da greve marcada pela CGT.
 

“Há uma visão clara de que o Congresso deve cumprir sua missão e esse presidente deve prestar contas ao que diz a Constituição”, disse o parlamentar pela província de Tucumán à rádio AM750.
 

Já Dante Sica, ex-ministro de Produção e Trabalho do governo Mauricio Macri –que apoiou Milei no segundo turno, em novembro– disse ao canal argentino TN que as medidas do novo governo vão desencorajar a “indústria experimental de trabalho” que leva à falência diversas pequenas e médias empresas, responsáveis por 70% do emprego privado.

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