STF (Supremo Tribunal Federal) formou maioria nesta quinta-feira (4) para derrubar o indulto concedido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ao ex-deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ).
 

O ex-parlamentar havia sido condenado no ano passado pelo STF a 8 anos e 9 meses de prisão, em regime inicial fechado, por promover ataques aos ministros da corte e estimular os atos antidemocráticos. A condenação também previa pagamento de multa e perda dos direitos políticos, mas ele foi beneficiado por decreto expedido pelo ex-presidente extinguindo a pena.
 

Em nota, a defesa de Silveira classificou o julgamento como “pão e circo”.
 

A presidente da corte, Rosa Weber, havia votado nesta quarta (3) pela inconstitucionalidade do decreto de Bolsonaro que autorizou o indulto. Ela é a relatora de quatro ações apresentadas pela Rede, PDT, Cidadania e PSOL contrárias ao benefício.
 

Rosa afirmou que o ex-presidente editou decreto individual “absolutamente desconectado do interesse público” e que o seu objetivo “foi beneficiar aliado político de primeira hora legitimamente condenado criminalmente pelo STF”.
 

“O chefe do Poder Executivo federal, ao assim proceder, não obstante detivesse aparentemente competência para tanto, subverteu a regra e violou princípios constitucionais produzindo ato com efeitos inadmissíveis para a ordem jurídica”, disse.
 

Seguiram o mesmo entendimento os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli e Cármen Lúcia.
 

Os dois ministros indicados ao Supremo por Bolsonaro, Kassio Nunes Marques e André Mendonça, divergiram de Rosa e defenderam a manutenção do indulto a Silveira.
 

Barroso, que fez um dos votos mais enfáticos do julgamento, afirmou que a condenação não havia desrespeitado os limites da proteção à liberdade de expressão.
 

“Só pode achar que houve violação à liberdade de expressão quem não se deu trabalho de ouvir ou ler as manifestações. Se for uma pessoa normal, terá ficado completamente horrorizado com o que se julgou. É de fazer perder a fé na condição humana de tão estarrecedoras as declarações”, disse.
 

Ele acrescentou que não cabe o argumento quando há ameaça de agressão física a ministros do Supremo, incitação à invasão do Congresso e STF e a criação de animosidade entre as Forças Armadas e as instituições nas declarações.
 

“As pessoas que falam, na minha visão, em Deus, pátria e família não podem compactuar com isso e deviam, se tiverem alguma dúvida, reunir a família na sala, evocar a proteção de Deus e exibir o vídeo. E, se acharem que está tudo bem, dizer para a família que esse é o país que temos, antidemocrático. É uma linguagem chula, grosseira, que mais parecia esgoto a céu aberto”, disse.
 

O ministro lembrou que indultos são concedidos por razões humanitárias ou dentro da política de desencarceramento de crimes menos graves para desafogar o sistema penitenciário. Também afirmou que Bolsonaro concedeu o benefício antes mesmo da publicação da decisão do STF e do fim das etapas recursais.
 

Já Mendonça argumentou não se tratar de reconhecer ou defender a existência de um ato praticado por agente estatal, mas que o controle exercido pela Justiça não é o único no sistema de freios e contrapesos previsto pela Constituição Federal.
 

Ele declarou que a corte já reconheceu, em decisões anteriores, a impossibilidade de se estipular limitações à clemência presidencial por atividade jurisprudencial ou por meio de legislação ordinária.
 

Mendonça também afirmou que, após o julgamento, “surgiram vozes na sociedade dizendo que a pena teria sido excessiva” e que não se pode excluir que Silveira é alguém próximo a ele politicamente, mas que ele mesmo votou por sua condenação.
 

“Ao meu juízo, diante de um instituto político, autorizado pela Constituição, entendo que, até pelo contexto daquele momento, que a concessão da graça [como é chamado o indulto individual] teve também efeito a pacificação, ainda que circunstancial e momentânea”, disse.
 

O julgamento começou na última quinta-feira (27), quando os ministros do STF ouviram as sustentações das partes, de terceiros interessados e também do procurador-geral da República, Augusto Aras.
 

Ao se manifestar, Aras opinou pela legalidade do indulto. Ele afirmou que a motivação para a edição de indultos pelo presidente da República é política, não administrativa, por esse motivo não se poderia falar em desvio de finalidade.
 

Comparou, ainda, o indulto com processos nos quais os ex-presidentes dos Estados Unidos Donald Trump e Bill Clinton concederam perdão a pessoas ligadas a eles.
 

O ex-deputado foi denunciado pela PGR (Procuradoria-Geral da República) sob a acusação de ameaçar integrantes da corte em redes sociais. Ele elegeu como alvo preferencial o ministro Alexandre de Moraes, relator de apurações que desagradam ao bolsonarismo.
 

Conforme a acusação da Procuradoria, Silveira defendeu, em duas ocasiões, o emprego de violência e grave ameaça para tentar impedir o livre exercício do Legislativo e Judiciário e, ao menos uma vez, instigou a animosidade entre as Forças Armadas e o STF.
 

Quando editou o decreto do indulto, Bolsonaro disse, em transmissão nas redes sociais, que a liberdade de expressão é “pilar essencial da sociedade” e que a sociedade encontra-se em “legítima comoção” devido à condenação. “A graça de que trata esse decreto é incondicionada e será concedida independente do trânsito em julgado [da ação]”, afirmou.
 

Silveira tentou se candidatar ao Senado na última eleição, mas foi impedido pela Lei da Ficha Limpa. Ele voltou a ser preso em fevereiro, por ordem de Moraes, por descumprimento de medidas impostas pela Justiça.